«Eu devia
este livro a essa majestade verde, soberba e enigmática, que é a selva
amazónica, pelo muito que nela sofri durante os primeiros anos da minha adolescência
e pela coragem que me deu para o resto da vida.
(...) A
luta de cearenses e maranhenses nas florestas da Amazónia é uma epopeia de que
não ajuíza quem, no resto do Mundo, se deixa conduzir, veloz e comodamente,
num automóvel com rodas de borracha – da borracha que esses homens,
humildemente heróicos, tiram à selva misteriosa e implacável.» (Ferreira
de Castro, no Pórtico do romance “A Selva”)
Há muito que o padre Manuel Pires Bastos queria juntar os colaboradores
do jornal “João Semana” para que pudessem conviver e trocar impressões sobre
este periódico centenário que muito tem feito pela cultura e historiografia vareiras. Em 10 de agosto o desejo do Sr. Abade concretizou-se, e as pessoas
que apareceram nesse dia na redação foram conhecer alguns lugares dos concelhos
de Ovar, Estarreja e Oliveira de Azeméis.
Ossela, terra natal do escritor Ferreira de Castro
A casa do escritor Ferreira de Castro, em Ossela (Oliveira de Azeméis) |
O ponto alto do passeio foi a visita à casa onde nasceu, em 24 de maio de 1898, o escritor José Maria Ferreira de Castro (na foto).
A tarde escaldava quando o grupo de Ovar chegou ao lugar de Salgueiros, em Ossela. (Os pneus da velha carrinha da Paróquia, conduzida pelo artista Marcos Muge, puderam arrefecer um pouco depois de terem andado uns bons quilómetros lá para os lados da serra).
Os colaboradores do jornal "João Semana" na casa de Ferreira de Castro |
A mala e os sapatos do escritor Ferreira de Castro FOTO: Fernando Pinto |
Ferreira de Castro, que também abraçou a carreira de jornalista, é um
dos autores portugueses mais traduzidos de sempre, sendo as suas obras
“Emigrantes” e “A Selva”, as mais lidas. Esta última foi escrita de 9 de abril
a 29 de novembro de 1929, e foi impressa “em princípios de maio de 1930, andava
eu, de novo como enviado de O Século, em viagem pelos Açores”, lembrou
o escritor osselense nas páginas iniciais de “A Selva”. (Partiu aos 12 anos de
idade para o Brasil, vivendo no Seringal Paraíso, no interior da Amazónia, e
posteriormente, em Belém do Pará, na foz daquele rio brasileiro. Viria a
falecer em 1974, com 76 anos de idade, sendo sepultado, a seu pedido, na Serra
de Sintra).
Antes de descer a escadaria de pedra daquela casa de meados do século
XIX, de traça rural, o grupo de Ovar deixou algumas palavras no último dos
muitos livros de visitas – o escritor José Saramago também passou por lá em
21 de maio de 1999, no Centenário do Nascimento de Ferreira de Castro –, e
depois atravessou a rua e entrou na Biblioteca de Ossela, edifício doado pelo
escritor, onde se podem apreciar, para além das suas obras, entre outro
espólio, alguns quadros de artistas oferecidos ao romancista.
Outros lugares visitados
Da parte da manhã, o primeiro ponto de paragem foi Pereira Jusã,
antigo lugar e concelho, da freguesia de Válega, Ovar, com o seu pelourinho (na
foto). O artista Marcos Muge tem ali um pequeno painel de azulejo doado aos
valeguenses em 2 de junho de 2014, por altura das comemorações dos 500 anos da
outorga do Foral Manuelino a Pereira Jusã.
Pereira Jusã, antigo lugar e concelho, da freguesia de Válega, Ovar FOTO: Fernando Pinto |
Em Estarreja, o grupo entrou na Igreja de São Tiago de Beduído e pôde
dar uma espreitadela na Casa da Areosa, do séc. XVIII.
Na Bemposta, Oliveira de Azeméis, visitámos o centro histórico do
antigo concelho e a casa e capela de São Gonçalo, propriedade do Juiz
Desembargador Carlos Joaquim Almeida e Sousa (na foto), assumido vareiro, que
recebeu de braços abertos os seus conterrâneos.
A Quinta do Barão, em Loureiro, foi o local escolhido para os
colaboradores do jornal retemperarem forças (na foto).
Na Quinta do Barão, em Loureiro FOTO: João Elvas |
Depois de um animado almoço, partimos em direção ao Parque de La
Salette, onde desfrutámos do ambiente festivo que se vivia naquele santuário.
O passeio terminou no aprazível Parque Temático Molinológico localizado
ao longo dos rios Ul e Antuã, nas freguesias de Ul e Travanca, região de moleiros
e moinhos, onde ainda se pode assistir às várias fases do fabrico do pão.
A “família” do “João Semana” está bem viva, e espera que os ovarenses
sigam os seus passos apoiando este jornal que resistiu a duas Grandes Guerras,
e que deseja continuar a cumprir o papel que lhe foi conferido há 101 anos,
porque um povo sem memória é um povo sem futuro.
TEXTO: Fernando Pinto
FONTE: jornal de Ovar "João Semana" (edição de 15/09/2015)
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para ouvir o Dr. Manuel Malícia,
colaborador do jornal "JOÃO SEMANA"