Jornal JOÃO SEMANA (15/08/2016)
TEXTO: Manuel Pires Bastos
Em 9 de setembro de 1943 é publicada no “João Semana” a escritura
de uma sociedade denominada Empresa de Melhoramentos de Ovar, Lda,
constituída em 15 de julho anterior, cujo objetivo era a exploração de “cinema,
teatro e quaisquer espetáculos, festas e diversões públicas e outros negócios
que a mesma Sociedade resolva explorar”.
Meses depois, em 11 de maio de 1944, crescendo o cinema
em altura, sem que o “João Semana” se pronunciasse sobre o assunto, e parecendo
a muitos vareiros ser isso estranho, os responsáveis pelo jornal vieram a
público para justificar o seu silêncio e a não intervenção da Paróquia, com o
texto “Varrendo a testada”, de que salientamos a seguinte passagem: “(...)
Não há que estranhar o nosso silêncio, quando outro mais alto se levanta: o das
entidades oficiais que nisso tinham que intervir. Pôr embargos... Mas que
embargos?, se, enquanto não fôr dada licença para tal obra ela está por
natureza embargada? ou não é isto? (...)”.
Entretanto, em 1 de junho, regressados de um retiro em
Fátima, visitaram a paróquia os Bispos do Porto, D. Agostinho de Jesus e Sousa,
e de Vila Real, D. António Valente da Fonseca, este natural de Válega. Sem
fazer qualquer referência ao Cine-Teatro, a notícia acrescenta que D.
Agostinho, que “pela primeira vez, esteve nesta vila, admirou a grandeza e
majestade da nossa paróquia, regressando ao Porto após uma breve paragem”.
D. Agostinho, que voltaria a Ovar em 22 de julho seguinte
para ministrar o Crisma – os últimos crismas haviam sido em 1905, 1918 e 1923
–, terá manifestado tolerância em relação a um ato consumado, até porque “a
Igreja não pode impedir o progresso”. (Clique no link para ler “O Cine-Teatro que (não) temos”, texto do jornalista Fernando Pinto, publicado em 01/12/2002).
![]() |
Cine-Teatro de Ovar |
Inconformado com a construção do edifício, o padre Boaventura deixou Ovar em 24 de fevereiro de 1944, ao fim de oito anos de paroquialidade exemplar, sendo logo substituído pelo padre Crispim Gomes Leite, vindo de Gondomar, onde fora Pároco e presidente da Câmara.
A fama de bom gestor nas coisas religiosas e civis terão
sido os predicados que aconselharam a sua nomeação, no intuito de ultrapassar a
crise que se instalara na sua nova paróquia, intenção a que o “João Semana” de
23 de março parece aludir ao referir, um mês depois da sua chegada: “Causou
a melhor impressão e está conquistando a mais grande das simpatias a apresentação
e ação do novo pároco de Ovar”.
Em 30/12/1944, quando da inauguração do Cine-Teatro – em que o “João Semana”
não pôde tomar parte (“por motivos estranhos à nossa vontade”, tal como versa a
notícia) –, os seus
responsáveis fazem votos para que o Cinema se oriente na esteira das “tradições
de trabalho, honestidade e fé do povo”.
Em 1 de março de 1945 e nos números seguintes, este
periódico anunciou, com publicidade da própria empresa, que em breve seriam
exibidos os filmes “O Bom Pastor” e “Fátima, terra de Fé”, com comentários
muito positivos. (De imediato, a mesma empresa viria a constituir a Sociedade
de Melhoramentos da Praia do Furadouro, com o fim de dotarem Ovar com um hotel
que funcionaria em 1946 – o
“Mar e Sol”, que substituiu uma anterior Pensão de Turismo.)
O padre Crispim partiria de Ovar em 7 de janeiro de 1952,
deixando atrás de si uma obra notável, embora nem sempre reconhecida nos seus
méritos.
Artigo publicado no jornal JOÃO SEMANA (15 de agosto de 2016)
http://artigosjornaljoaosemana.blogspot.pt/2017/02/jornal-joao-semana-e-o-cine-teatro-de.html
http://artigosjornaljoaosemana.blogspot.pt/2017/02/jornal-joao-semana-e-o-cine-teatro-de.html
ADENDA -----------------------------------------
Na tarde
de 9 de agosto último, o presidente da Câmara Municipal de Ovar, Salvador
Malheiro, decidiu avançar para a posse administrativa do prédio do Cine-Teatro
de Ovar, propriedade privada, que desde há vários anos estava sem utilização
por falta de condições de segurança no interior e no exterior, e que por isso
está a ser demolido quando do fecho desta edição do jornal “João Semana”
Segundo
o autarca, “este imóvel faz parte da história ovarense e a demolição parcial
está a ser feita por um empresa qualificada, tentando-se manter o máximo do
seu património arquitetónico”. TEXTO: Jornal "João Semana" (15/08/2016)
![]() |
Cine-Teatro de Ovar, dias antes de demolido Foto:João Elvas |
![]() |
Momento em que as letras do Cine-Teatro de Ovar estavam a ser retiradas por ordem da Câmara Municipal (09/08/2016) Foto: Fernando Pinto |
Sem comentários:
Enviar um comentário